segunda-feira, 13 de dezembro de 2010

O Novo Jornalismo e as mudanças no trabalho do jornalista:Uma Abordagem Discursiva

Marília Giselda Rodrigues
Grupo Atelier/LAEL PUC-SP/CNPq

O jornalismo impresso passa por um período de grandes transformações, decorrentes do desenvolvimento de novas tecnologias de informação e comunicação. Além do encurtamento do tempo de produção de notícias, o jornalista agora deve produzir para diferentes plataformas (impressa e digital em diferentes suportes), o que significa aumento do volume de trabalho. Ao mesmo tempo, o jornalista e o jornalismo tradicionais perdem a primazia na produção de notícias e concorrem com múltiplas possibilidades de comunicação e novos atores. O jornalismo moderno do século XX, que já fora o “novo jornalismo”, passa a ser chamado a “velha mídia” e precisa então se reinventar. Para a elaboração de meu projeto de pesquisa de doutorado, em andamento, debrucei-me inicialmente sobre um conjunto de textos que versam sobre o fim do jornalismo, tomados como um sinal (GINZBURG, 1986/1991) de mudanças significativas. Essa análise preliminar permitiu a construção de um espaço discursivo em que dois discursos – o do jornalismo tradicional e o do “novíssimo” jornalismo – disputam a legitimidade de um papel na sociedade, e a formulação de uma pergunta-problema de pesquisa: como se constitui, a partir de uma relação interdiscursiva com outro discurso que o precede, um novo discurso jornalístico, e quais seriam suas características, ou suas matrizes semânticas? Os pressupostos teóricos são os da Análise do Discurso francesa, sobretudo os estudos de Dominique Maingueneau, que têm em Gênese dos Discursos (1984/2007) seu marco de singularidade. O tratamento dos discursos se dá a partir da noção de uma semântica global, em que as mesmas determinações de uma dada formação discursiva explicam as práticas dos adeptos de um discurso, advindas de diferentes domínios semióticos, seu ethos, a organização das comunidades discursivas, a intertextualidade e os modos de coesão dos discursos, os gêneros possíveis e os temas tratados, enfim, o caráter global dessa semântica restringe simultaneamente o conjunto dos planos discursivos e todos os domínios da discursividade, não somente o enunciado, mas também a enunciação, e mesmo, além dela, as instituições, os modos de organização dos homens, submetidos ao mesmo processo de estruturação que os discursos correspondentes. Se o trabalho dos jornalistas é ser o mediador das diversas falas que se entrecruzam no espaço público, produzindo discursos e colocando-os em circulação, então mudanças no trabalho devem afetar também tais discursos, uma vez que se trata de ação empírica que deixa rastros no produto final. Trata-se daquilo que Maingueneau (1984/2007, p. 140) denomina “ritos genéticos”, o conjunto de atos realizados por um sujeito em vias de produzir um

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enunciado, uma noção mais ampla que a de pré-texto (anotações, gravações, rascunhos etc), já que inclui também comportamentos não escriturais, e que são inseparáveis do discurso, portanto ligados a um mesmo sistema de restrições semânticas. Assim, o objetivo da pesquisa é conhecer, ao mesmo tempo, o trabalho do jornalista em momento de transformações na atividade, e o sistema de boa formação semântica que estrutura o novo jornalismo que ora se constitui. Para isso foi necessário recorrer também à Ergologia, disciplina do trabalho, que o entende como atividade humana que nutre e cruze todas as demais esferas da vida (SCHWARTZ, 2000, 2007). Parte do corpus da pesquisa vem se produzindo em campo, com observação e entrevistas na redação da Folha de S. Paulo. Aqui, apresento uma breve análise de outro conjunto do corpus, em que comparo exemplares do jornal antes e depois de reforma apresentada em maio de 2010. É possível apreender algumas restrições semânticas do “velho” e do “novíssimo” jornalismo, diferenças e relações entre duas práticas discursivas. O ideal de objetividade e neutralidade, sempre tão caro aos jornalistas, parece ser substituído, ainda que lentamente, pela possibilidade de assumir uma posição e uma intimidade maior com os leitores.

Palavras-chave: Linguagem e trabalho; discurso e enunciação; semântica global; Ergologia; Jornalismo.

Referências Bibliográficas

GINZBURG, C. (1986) Sinais: raízes de um paradigma indiciário. In: _____ C. Mitos, emblemas, sinais: morfologia e história. Trad. Federico Carotti. São Paulo: Companhia da Letras, 1991, p. 143-277.

MAINGUENEAU, D. (1984) Gênese dos discursos. Trad. Sírio Possenti. 1ª reimpressão. Curitiba: Criar Edições, 2007.

SCHWARTZ, Y. Trabalho e uso de si. In: Revista Pro-posições. UNICAMP. vol. 11. Julho-2000, p. 34-50.
http://www.pgletras.uerj.br/linguistica/jel/2010/resumos/VIJELUERJ_SC_X_R01.pdf

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